domingo, 30 de novembro de 2025

Bioética e Saúde: Uma Perspectiva Complexa, Integrada e Compreensiva

 José Roberto Goldim


A Bioética, quando entendida em sua perspectiva complexa, permite reflexões sobre vários temas. A saúde é um destes temas preferenciais para a reflexão bioética.  A perspectiva complexa associada às ações na área da Saúde permite envolver um conjunto amplo de argumentos que servem para verificar a sua adequação. 

A saúde têm múltiplos significados de acordo com o entendimento, com o paradigma utilizado e da abrangência estabelecida para as suas ações. a ter uma abordagem baseada no paradigma das evidências epidemiológicas ou das evidências narrativas. Quanto a abrangência, podem ser identificadas a  saúde individual, a saúde pública, a saúde coletiva, a saúde única, a saúde global e a saúde planetária.

Os diferentes entendimentos da saúde

Hipócrates, ao redor de 340aC, na Grécia, tinha uma concepção integrada de saúde. Isto ficou evidente na sua obra Ares, Águas e Locais. Neste texto ele afirmava que o local onde se vive influencia diretamente a saúde, que depende da relação entre o indivíduo e o meio, incluindo o clima e as estações; a água e os alimentos; o estilo de vida, os hábitos e as emoções. Em outros textos, Hipócrates enfatizou a importância da noção de equilíbrio para o adequado entendimento da saúde.

Galeno rejeitava a noção de que saúde é apenas a ausência de doença, pois afirmava que saúde e doença eram independentes. Ele afirmava que existem diferentes graus de saúde de acordo com o funcionamento ou a constituição dos órgãos corporais.

Com o passar do tempo, a ideia de que saúde é ausência de doença se consagrou. É uma perspectiva que valoriza o paciente individualmente, com ênfase nos aspectos biológicos. É neste contexto que o médico passa a ter o papel central de identificar e enfrentar as  doenças. O local onde a saúde é tratada passou a ser identificado como sendo o hospital. Neste contexto, os médicos, a partir da metade do século XIX, passaram a contar, de forma sistemática e profissional, com a colaboração das Enfermeiras na realização de suas atividades.

No início do século XX, a saúde também passou a ser entendida como sendo um direito humano coletivo. A Revolução Mexicana, de 1913, a Revolução Russa, de 1917, e a Constituição de Weimar do Império Alemão, de 1919, consagraram este entendimento. Este direito coletivo garante o acesso aos cuidados de saúde para todos os cidadãos, sendo a que saúde se realiza no âmbito de toda a sociedade. O Art. 196 da Constituição da República Federativa do Brasil, de 1988, consagrou este entendimento ao propor que a "saúde é um direito de todos e um dever do Estado". A saúde passou a ser considerada como um critério de cidadania.

Com a criação da Organização Mundial da Saúde, em 1946, foi dado um outro entendimento do que é saúde. O modelo de abordagem biopsicossocial passou a ser incorporado e a saúde foi definida como o estado de pleno bem-estar físico, mental e social. Os aspectos biológicos foram acrescidos dos aspectos biográficos do individuo. Esta nova perspectiva também teve uma alteração de quem realiza saúde e onde que ela ocorre. Aos médicos e enfermeiros foram acrescidos todas as demais profissões da área da saúde. No Brasil, de acordo com a Resolução CNS 218/1997, são considerados profissionais de saúde:  Assistentes Sociais, Biólogos, Profissionais de Educação Física, Enfermeiros, Farmacêuticos, Fisioterapeutas, Fonoaudiólogos, Médicos, Médicos Veterinários, Nutricionistas, Odontólogos, Psicólogos e Terapeutas Ocupacionais. A partir da Conferência de Alma-Ata, realizada em 1978, o local onde a saúde ocorre passou a ser a rede de saúde, incluindo, além dos hospitais, os postos de diferentes níveis de complexidade. Novos profissionais e novos locais foram sendo incorporados às ações de saúde, entendida de forma mais abrangente.

Os paradigmas em saúde

Dois paradigmas são mais utilizados, o da Saúde baseada em Evidências Epidemiológicas e da Saúde baseada em Evidências Narrativas. Habitualmente, estes termos são utilizados de forma mais restrita, como Medicina baseada em Evidências e Medicina baseada em Narrativas. A opção de utilizar a expressão Saúde, ao invés de Medicina, tem como objetivo ampliar para além de um único enfoque profissional, envolvendo todos os demais participantes nas ações. 

Saúde baseada em Evidências Epidemiológicas é uma abordagem quantitativa que tende a ter  uma perspectiva de totalidade dos fenómenos estudados, ou seja, de buscar explicações que abarquem o conjunto de indivíduos, sem levar em conta as suas peculiaridades. Esta perspectiva baseada em evidências científicas, especialmente as epidemiológicas. 

Segundo Guyatt (1992), Saúde baseada em Evidências é uma abordagem que 

"retira a ênfase da intuição, da experiência clínica assistemática e de uma lógica patofisiológica como base suficiente para a tomada de decisões clínicas e enfatiza o exame das evidências da pesquisa clínica". 

Segundo este mesmo autor, esta abordagem exige novas habilidades dos profissionais e dos pacientes. Os profissionais têm que aprender a realizar buscas continuadas na literatura científica e a utilizar regras formais de avaliação destas evidências contidas nas produções científicas. 

HG Wells (1903), de forma antecipatória já havia dito que: 

"o pensamento estatístico será, um dia, tão necessário para a cidadania eficiente, quanto a habilidade de ler e escrever!"

A conjugação do pensamento estatístico com as buscas continuadas de dados publicados levou à possibilidade de estabelecer uma classificação das evidências de acordo com a confiança e validade associadas. A maneira mais comum de expressar esta classificação foi por meio da Pirâmide de Evidências Epidemiológicas. A opinião de especialistas é a evidência que tem a menor confiança e validade. No topo da pirâmide, ao contrário, estão  as revisões sistemáticas e os estudos de metanálise.

Esta é a mesma linha de pensamento da citação atribuída a W. Edwards Deming, porém não localizada em qualquer dos seus textos:

"sem dados, você é apenas uma pessoa com uma opinião". 

Porém, não basta ter apenas informações, se elas não estiverem associadas a uma perspectiva sobre o mundo, ou seja, a um paradigma. Matt Coyle (2021), fez um contraponto a proposta de Deming, ao afirmar que:
"sem uma opinião para guia-lo, você é apenas mais uma pessoa com dados".

Saúde baseada em Evidências Narrativas valoriza o individual, a singularidade, as múltiplas possibilidades de entender uma mesma situação de acordo com o paciente ou situação envolvida. É a recuperação da possibilidade de contar a histórica individual de cada pessoa, de cada paciente.  É, de acordo com Goyal e colaboradores (2008), lembrar que os pacientes tem nome e endereço, ou seja, são pessoas únicas e localizadas. A proposta destes autores é de que os profissionais de saúde devem sair dos relatos impessoais dos pacientes. 

Infelizmente, o conceito de narrativa tem sido confundido com o de versão. Narrativa, segundo Alberti (2012) é:
"é o estabelecimento de uma organização temporal, através de que o diverso, irregular e acidental entram em uma ordem, que não é anterior ao ato do relato, mas coincidente com ele; que é pois constitutiva de seu objeto."

Versão, por outro lado, são os "diferentes modos de contar ou interpretar o mesmo ponto, fato, história etc.", segundo esta mesma autora. Ou seja, a narrativa organiza um relato, informações antes dispersas que passam a fazer sentido., enquanto que a versão pode ser fantasiosa e infundada.

Zaharias (2018) ao questionar o que é Medicina baseada em Narrativa responde que é uma habilidade de contar histórias. Contar histórias é reconhecer a singularidade de cada paciente, é estabelecer e aproximar as conexões entre o profissional e o próprio paciente, é, finalmente, reconhecer que podem existir diferentes perspectivas para entender a mesma situação. Fazer a narrativa é organizar estas informações de uma maneira que permita o seu melhor entendimento por parte de todos.

Isto já havia sido descrito por Hipócrates, no seu livro Prognóstico. Neste texto, a palavra prognóstico, não se refere apenas a predizer o futuro, mas sim dar esta continuidade de informações ao longo do tempo, é estabelecer uma trajetória, uma hipótese, um modelo explicativo para a situação que busca descrever. O texto de Hipócrates estabelece que:

"Parece-me que é excelente que o médico estabeleça hipóteses. Pois, se ele investiga e relata aos seus pacientes, o presente, o passado e o futuro, antes mesmo que ocorram, preenchendo as lacunas nos relatos dados pelos doentes, ele terá mais condições de compreender os casos. Desta forma, os pacientes se entregarão a ele, com confiança, para tratamento."  

Muitas vezes estes paradigmas epidemiológico e narrativo são entendidos como sendo antagônicos, quando, na realidade, são complementares. Subbiah (2023) reenquadrou a Pirâmide de Evidências na perspectiva de um Iceberg de Evidências. A antiga Pirâmide é apenas a parte visível desta gigantesca estrutura de conhecimentos. Na parte "submersa", que aprofunda estas questões, estão incluídas as novas contribuições geradas pela tecnologia da informação, como a internet das coisas e o aprendizado de máquinas, assim como o paradigma narrativo. Os dados da História Natural, incluindo aspectos ambientais e sociais, e da história pessoal passam  a ser parte de mesmo conjunto de informações. 

Esta é a grande contribuição da teoria da complexidade: permitir esta visão integrada de paradigmas antes isolados. Não é uma fusão, uma perda de fronteiras, nem mesmo uma apropriação: é a possibilidade de diálogo, de troca de saberes entre duas diferentes perspectivas - epidemiológica e narrativa - de descrever a mesma realidade.

A abrangência da saúde

Existem múltiplas abrangências para a saúde. Os enfoques podem variar do nível individual, de uma única pessoa, até a saúde planetária, quando as questões mais amplas são abarcadas.

A perspectiva da saúde ser entendida apenas como um enfrentamento às doenças, tinha uma  perspectiva individual e biológica, baseada na pessoa doente. Saúde era o contrário da doença. O foco desta abrangência era manter e salvar a vida desta pessoa. A inclusão do bem-estar na definição de saúde proposta na criação da Organização Mundial da Saúde, em 1946, incluiu, além das questões biológicas, as relacionadas à saúde mental e social. Ou seja, as questões biográficas passaram a ser também consideradas. Cada ser humanos não era mais considerado apenas como um ser vivo, mas também como uma pessoa. A perspectiva da Saúde não era mais apenas preservar a vida, garantir a sobrevivência, mas também ter uma atenção ao viver, ao bem-viver, de dada um. Desta forma, os aspectos relacionais entre pessoas, antes vistos apenas na perspectiva de doenças infectocontagiosas, passaram a ter um novo olhar. 

A abrangência das questões envolvendo a saúde foi sendo progressivamente ampliada para abarcar as questões de Saúde Pública de Saúde Coletiva. Esta mudança da perspectiva individual para coletiva surgiu no final do século 19 e no início do século 20. A Saúde Pública se utilizou  dos conhecimentos gerados pela Epidemiologia, para estabelecer políticas públicas de alocação de recursos na área da saúde. Por outro lado, com a evolução do pensamento dos Direitos Humanos, alguns Estados começaram a garantir o direito à saúde, entendido como um direito coletivo e não individual. Esta inclusão da saúde como um critério de cidadania, é que permitiu o surgimento da Saúde Coletiva. A saúde pública assumiu uma proposta mais quantitativa, enquanto que a saúde coletiva passou a abordar estas mesmas questões de uma forma mais qualitativa, mais crítica e articulada. 

No final do século 20 foram incorporadas as reflexões sobre as questões ambientais. Houve a proposta de que o ambiente saudável é um direito fundamental transpessoal, ou seja, que ultrapassa inclusive a perspectiva humana. Isto acarretou também uma nova ampliação do entendimento do que é saúde, com a introdução da saúde única, da saúde global e da saúde planetária.

Ampliando ainda mais esta visão, surgem a Saúde Global e a Saúde PlanetáriaA saúde global abarcando, de forma mais abrangente, o conjunto de todos os elementos anteriormente citados. É a saúde não mais na perspectiva de um país ou região, mas do conjunto dinâmico das ações sanitárias em nível supranacional. É uma abrangência que leva em conta as biorregiões. A saúde global propõe uma perspectiva abrangente para as políticas públicas. Por sua vez, a saúde planetária vai ainda mais além. O seu objeto de preocupação é o planeta como um todo, é o entendimento sistêmico e integrado da Terra como Gaia. A saúde planetária passa a incluir na saúde, as questões climáticas, o uso de recursos naturais, as diferentes formas de produção e uso de energia, as alterações de paisagens e de ecossistemas, a mineração e a emissão de gases. Estas questões mais abrangentes, que antes não eram abordadas na perspectiva da área da saúde, passaram a assumir crescente importância devido às suas repercussões.

A perspectiva de Uma Só Saúde (One Health) surgiu de uma proposta de integração mais efetiva entre os aspectos de saúde envolvendo diferentes seres vivos, não só considerando os humanos. Nesta perspectiva a saúde humana e a saúde animal deveriam ter uma convergência e não uma atuação em paralelo. A Medicina Humana e a Medicina Veterinária devem ter uma maior proximidade, em termos de entendimento e de atuação. Inúmeras questões podem ser levantadas nesta nova visão. A pressão de sobrevivência das espécies animais selvagens que vivem em ecossistemas ameaçados ou em transformação, e que passam a ter maior interação com populações humanas é um destes temas. As diferentes formas de produção de animais para servirem de alimento é outro tema relevante. Da mesma forma, o aumento da quantidade e do tipo de interação  entre humanos e animais de estimação é outra questão importante desde o ponto de vista da saúde. Os animais de estimação passaram a fazer parte da vida diária e familiar, com maior interação e convívio, inclusive tendo estas relações reconhecidas como pertencentes a "famílias multiespécies". Os animais de estimação, assim como os animais de produção, começaram a receber medicamentos semelhantes aos utilizados por humanos, com repercussões ambientais e sanitárias importantes. A própria relação com microorganismos também mudou, ao invés de um enfrentamento, a nova perspectiva é de adaptação, de convivência segura e não de eliminação. A relação menos estudada, mas que é uma importante fronteira a ser ainda devidamente entendida, é da interação dos humanos com as plantas. As questões de saúde decorrentes do uso de alimentos vegetais, suas transformações e modos de produção, incluindo nutrição vegetal e controles de produção. Como fica evidente, a perspectiva da proposta de Uma Só Saúde exige uma perspectiva relacional e dinâmica de todos os fatores envolvidos, seja em âmbito individual, populacional, comunitário ou ambiental.

Em uma perspectiva linear de pensamento, cada um destes diferentes níveis de saúde - saúde individual, saúde pública, saúde coletiva,  saúde global, saúde planetária e uma só saúde - cada um seria apenas uma ultrapassagem da anterior. Porém, quando estas múltiplas perspectivas são abordadas de forma complexa,  elas não são excludentes, mas se complementam, permitindo uma visão abrangente do todo, sem perder a peculiaridade de cada uma das partes.  Todas as perspectivas são importantes de acordo com a sua adequação e relação às demais.  A abordagem complexa da Saúde permite uma visão integrada da unidade na multiplicidade.

Um conceito integrador que poderá facilitar a compreensão conjunta das questões de Bioética, entendida como complexa, com a Saúde, entendida em uma perspectiva de One Health/Uma Só Saúde, é o de One Welfare, ou Bem-estar Único. Nesta perspectiva a saúde humana, animal, vegetal e as questões ambientais passam a ter esta perspectiva de bem-estar, que fica muito coerente com a proposta de adequação das ações. One Welfare poderá ser um elemento facilitados na compreensão abrangente das relações entre Saúde e Bioética. 

Bioética, Saúde e Complexidade

A Bioética e a Saúde, quando entendidas de forma complexa, expressam esta perspectiva integradora de competências científicas e humanísticas. A saúde deve ter este novo olhar integrado, que permita construir argumentos que possam servir para explicar melhor a atual situação que estamos enfrentando. Não é uma visão de escolha, de exclusão, mas sim de inclusão de múltiplas perspectivas de entendimento. A contribuição da Bioética é a de permitir uma reflexão sobre a adequação das ações envolvidas na área da saúde, em todos os seus múltiplos significados e usos.

Referências

Hippocrates. Vol. I - Ancient Medicine. Airs, Waters, Places. Epidemics 1 and 3. The Oath. Precepts. Nutriment. Boston: Harvard University Press; 1923. 

Galeni. Methodus medendi: vel De morbis curandi. Paris: Didier Maheu; 1519.

Guyatt G. Evidence-Based Medicine. JAMA. 1992 Nov 4;268(17):2420. 

Wells HG. Manking in the making. New York: Chapman & Hall; 1903.





Texto publicado em 13/10/2023 e atualizado em 30/11/2025

quinta-feira, 23 de outubro de 2025

A Preparação Cirúrgica Também Passa Pela Bioética

 José Roberto Goldim

A afirmação de que a preparação cirúrgica também passa pela Bioética pode parecer estranha, mas é fundamental para entender a abordagem complexa e segura dos procedimentos realizados na área da saúde nos dias atuais. 

A preparação cirúrgica não é apenas um procedimento técnico. A abordagem adequada do contexto cirúrgico contempla inúmeros aspectos que extrapolam os aspectos meramente técnicos. Podem e devem ser consideradas questões associadas aos aspectos assistenciais, no sentido mais amplo, dos aspectos sociais e familiares, das eventuais questões culturais e espirituais que podem estar envolvidas. O procedimento cirúrgico pode ser avaliado na perspectiva de ser parte de um processo assistencial mais amplo, e não apenas como um evento isolado

Em função destas inúmeras perspectivas, os profissionais, pacientes e familiares podem estar vivenciando situações que podem prejudicar um adequado processo de tomada de decisão. Estas situações podem estar associadas à incerteza, ao medo, ao desconhecimento ou falta de informação adequada. É nesta hora que as consultorias de Bioética Clínica podem auxiliar. 

As consultorias de Bioética vêm sendo realizadas no Hospital de Clínicas de Porto Alegre (HCPA) desde 1994. Ao longo deste período, foram prestadas 7224 consultorias envolvendo 3262 pacientes atendidos em 103 diferentes especialidades. Estas consultorias têm possibilitado integrar as considerações bioéticas no cuidado real dos pacientes, com reflexos na qualidade do cuidado.

Para gerenciar essa complexa rede de informações e temas presentes nas consultorias prestadas, assim como para garantir o acompanhamento e avaliação adequadas, em tempo real, por especialidades e temas, foram desenvolvidas Ferramentas de Inteligência Artificial no Laboratório de Pesquisa em Bioética e Ética na Ciência (LAPEBEC) do HCPA. Tais ferramentas auxiliam na gestão da resolutividade, permitindo que a reflexão bioética seja adequada às peculiaridades de cada especialidade cirúrgica, mas garantindo a sua singularidade.

As consultorias de Bioética Clínica auxiliam na reflexão de situações nas quais  profissionais, pacientes, familiares ou instituições tenham algum desconforto moral associado. Ao abordar estas situações de incerteza, a Bioética Clínica pode melhorar o entendimento e a repercussão das escolhas que devem ser feitas pelos profissionais e pelos pacientes. Discutir estas questões associadas ao processo de comunicação e tomada de decisão pode influenciar, de forma positiva, na qualidade da preparação cirúrgica mais segura. Essa segurança não se restringe apenas ao profissional e ao paciente, mas é estendida também para as próprias instituições envolvidas.

Dentre os múltiplos temas abordados pela Bioética Clínica na área cirúrgica, é possível destacar os seguintes aspectos presentes nas consultorias já realizadas para diferentes especialidades cirúrgicas:

  • Processo de Consentimento e Comunicação: A garantia de que o paciente compreenda o procedimento, seus riscos e benefícios. A qualidade da Comunicação entre todos os participantes do processo é igualmente crucial.

  • Relação Profissional-Paciente e Equipe/Família: A Bioética atua na harmonização da Relação Profissional-Paciente e na definição do papel da Equipe e da Família no processo de Tomada de Decisão.

  • Diretivas e Fim-de-Vida: Questões como as Diretivas Antecipadas (DAV), as questões associadas ao período de Fim de vida e os Cuidados Paliativos precisam ser consideradas na preparação cirúrgica, especialmente em pacientes com condições complexas ou prognóstico reservado.

  • Contexto Sistêmico e Social: Outros fatores que influenciam a preparação incluem a alocação de Recursos, as implicações Sociais e Espirituais, e temas sensíveis como Transplantes, Pesquisa, Privacidade e Confidencialidade.

Em suma, a Bioética Clínica amplia a abrangência da reflexão sobre os aspectos técnicos da preparação cirúrgica. Ao fornecer um espaço de reflexão para lidar com o desconforto moral e integrar considerações éticas complexas — desde o consentimento e a comunicação até o gerenciamento de recursos e diretivas avançadas —, ela influencia positivamente na preparação cirúrgica mais segura para todos.


Texto base para a apresentação feita no Health Meeting, em 23/10/2025, no Hospital do Amanhã do Hospital de Clínicas de Porto Alegre (HCPA)

domingo, 12 de outubro de 2025

Bioética de Corredor: a inserção das consultorias de Bioética Clínica na assistência

José Roberto Goldim 

A Bioética Clínica surgiu da necessidade de discutir situações que geram desconfortos morais no profissionais, paciente ou familiares. É deste desconforto que vem a necessidade de discutir e refletir de forma conjunta. Os Comitês de Bioética Clínica e os consultores de Bioética Clínica foram algumas das alternativas de abordagem para estas situações.

Porém, muitas vezes, as discussões servem mais para os consultores do que para as pessoas que demandam a sua realização. O foco teórico, o tempo de resposta e a reinserção dos próprios consultores na realização destas atividades geram esta percepção. 

Não adianta apenas discutir os aspectos teóricos. Classificar os casos de acordo com os princípios, com os direitos humanos envolvidos, com a relação risco-benefício, pode ser útil em atividades educacionais de Bioética, mas podem não auxiliar na superação do desconforto.

Da mesma forma, receber a demanda de uma consultoria e programar a sua discussão para uma próxima reunião do Comitê de Bioética Clínica não é uma resposta eficaz. Na maioria das vezes, as respostas são esperadas em tempo real, na condução do caso em si. Em muitas situações, as suas características podem mudar rapidamente. A resposta esperada pelos profissionais, pacientes ou familiares é imediata, no tempo das ações assistenciais.

Os consultores de Bioética Clínica têm que ser familiarizados com as questões assistenciais. Eles precisam ter conhecimentos que permitam entender as situações que lhes estão sendo apresentadas, têm que ter familiaridade com a realidade das atividades de assistência. A sua inserção nestas atividades não é uma característica imprescindível, mas auxilia em muito na realização de consultorias mais efetivas.

O grande desafio para a capacitação dos profissionais que atuam na área de Bioética Clínica é conciliar os conhecimentos teóricos, que servem de base para a argumentação, com a prudência necessária ao seu enfrentamento destes problemas (7). 

Prudência é a capacidade de deliberar, ou auxiliar na deliberação, sobre a adequação de uma determinada situação, é a razão prática. Ter Prudência exige uma atitude de inserção na realidade, de considerar cuidadosamente os diferentes aspectos associados e as suas respectivas características em termos de intenções, interesses, consequências, direitos e deveres associados, responsabilidades para si mesmo e para com os outros envolvidos.

Para ser uma pessoa prudente, é necessário conhecer os diferentes referenciais teóricos, que podem ser associados à situação objeto da reflexão, pois estes serão fundamentais para a elaboração de uma argumentação capaz de ser discutida racionalmente. São estes aspectos que enquadram as situações particulares em padrões gerais, que permitem fazer associações entre diferentes casos ou até mesmo as generalizações, que servem como elementos de entendimento e de significado para a experiência. Contudo, os padrões não podem se sobrepor às peculiaridades de cada caso, devem permitir fazer analogias, buscar aplicar os conhecimentos advindos das vivências de casos semelhantes.

Pois é sempre importante lembrar que cada situação é única, é singular, merecendo, desta forma, uma reflexão que atenda às suas peculiaridades. 

É deste reconhecimento simultâneo do caráter geral e particular de cada situação trazida à consultoria na área de Bioética Clínica que o consultor deve partir para auxiliar quem lhe pediu ajuda. É um misto de conhecimentos teóricos com a sensibilidade para os aspectos peculiares de cada caso que surgem as reflexões e, eventualmente as recomendações, que podem ser compartilhadas.

É importante que as consultorias de Bioética possam ser prestadas nos próprios locais de atendimento assistencial, que os consultores tenham uma interação pessoal e direta com as pessoas envolvidas, respeitando os espaços de deliberação já existentes. Os consultores de Bioética podem e devem se deslocar às unidades de atendimento onde os pacientes estão sendo atendidos, em tempo real. Quem solicita uma consultoria não deve ficar aguardando por um longo período, pois as suas decisões estão sendo pressionadas pela própria situação objeto de reflexão.

Não há necessidade de dar uma recomendação imediata, mas é importante demonstrar prontidão na resposta à consultoria. Muitas situações necessitam de um tempo de maturação, de um período que permita a interação e a troca de informações e sentimentos. Mas o importante é desencadear esses processos de ajuda a quem demanda uma consultoria. Nem sempre é a resposta que é aguardada, mas sim a sensação de estar compartilhando com outras pessoas de confiança as suas inquietudes frente ao caso. É desta hesitação que surge o caráter de humanidade das decisões a serem tomadas.

Esta inserção das consultorias de Bioética Clínica nas atividades assistenciais é que recebeu a denominação de Bioética de Corredor. É uma proposta que permite uma resposta no tempo certo, ao se associar às demais atividades desenvolvidas com os pacientes. A Bioética de Corredor pode ser uma estratégia de compartilhar situações de inquietudes e intranquilidades vivenciadas por  os profissionais, pacientes e familiares. A consultoria de Bioética, desta forma, não aplica, mas insere a discussão dos múltiplos aspectos bioéticos associados a estas situações. 

Albert Jonsen fez o seguinte comentário em seu texto sobre Ética Clínica e Casuística:

        O espírito dos antigos casuístas habitam os corredores dos modernos hospitais.

Este é o mesmo espírito que a Bioética de Corredor compartilha e vivencia. 

Referências

Jonsen A, Toulmin S. The Abuse of Casuistry: a history of moral reasoning. Berkeley: University of California Press; 1988. 

Ver também:
Bioética de Corredor; uma abordagem útil e necessária para as consultorias de Bioética Clínica (14/11/2022)


segunda-feira, 22 de setembro de 2025

Doação de órgãos, confiança e solidariedade

 José Roberto Goldim

Os transplantes de órgãos são uma realidade nos sistemas de saúde de  diferentes países. Mesmo assim, alguns desafios bioéticos ainda estão  presentes e necessitam ser refletidos. A realização de transplantes envolve não  apenas o paciente e a equipe assistencial, mas sim a sociedade como um todo.  Sem a participação ativa da sociedade não há recursos para a realização dos  procedimentos, não há doação de órgãos, nem condições para a manutenção  dos pacientes após a sua realização. A relação da sociedade com a realização  de transplantes está baseada na confiança.  
Os transplantes abriram perspectivas de tratamento que permitiram a  sobrevivência de pacientes, antes tidos como sem qualquer alternativa de  tratamento. Mas também trouxeram situações novas. Receber em seu corpo um  órgão de outra pessoa é, no mínimo, inusitado. Estabelecer um novo critério para  a morte de uma pessoa também foi outra mudança decorrente dos transplantes. 
Em maio de 1968, o Comitê Ad Hoc da Escola de Medicina da Universidade de  Harvard para Examinar a Definição de Morte Encefálica publicou as suas  conclusões (1)19. Este Comitê foi formado em função do impacto mundial da  realização do transplante de coração feito na África do Sul pela equipe liberada  por Christian Barnard. Foram dadas duas razões para a proposta de utilização  do critério encefálico para o estabelecimento da morte. A primeira se associa aos  procedimentos de reanimação cardiorrespiratória e as medidas de suporte de  funções vitais, principalmente os ventiladores artificiais. Estas mudanças  estavam relacionadas ao surgimento dos cuidados intensivos e das unidades de  tratamento intensivo, nos anos 1950. Estes novos cenários de assistência  alteraram o atendimento dos pacientes gravemente doentes e em final de vida.  O segundo motivo foi a própria obtenção de órgãos para a realização de  transplantes.  
A proposta de um novo critério para o estabelecimento da morte de uma pessoa  foi acolhida em tempos distintos pelas sociedades de diferentes países. As  sociedades dos países ocidentais tiveram mais facilidade em aceitar, enquanto  que as dos países orientais demonstraram maior resistência. Isto pode ser  explicado, pelo menos em parte, por uma manifestação do Papa Pio XII, na  abertura de Congresso de Anestesiologia em Roma, em 1957, afirmando que “a  caracterização da morte é um ato médico”20. Nesta manifestação o Papa Pio XII  respondeu a perguntas encaminhadas pelos anestesistas principalmente em  relação a reanimação cardiorrespiratória. 
A diferenciação dos conceitos de vida e de viver é fundamental para entender  esta mudança. A morte pelo critério cardiotorácico se associa à vida, em seus  aspectos biológicos, enquanto que o critério encefálico se relaciona ao viver, aos  aspectos biográficos, à vida relacional da pessoa. A reflexão bioética deve levar  em conta tanto os aspectos biológicos como os biográficos. No critério  cardiorrespiratório a vida é o ponto primário de constatação, enquanto que o  viver é uma decorrência deste. Qualquer pessoa poderia constatar um óbito  baseado no critério cardiotorácico, pois ele era autoevidente. Na morte  caracterizada pelo critério encefálico, ao contrário, o final do viver é que  determina o final da vida. São necessários conhecimentos específicos para ter o  adequado entendimento dos sinais que caracterizam esta situação. Este foi um  dos impactos desta nova proposta.  
A partir da constatação da morte de um paciente, utilizando o critério encefálico,  ou seja, do final de seu viver, é possível ainda manter as medidas de suporte de  suas funções biológicas por algum tempo. É neste período de preservação  apenas da vida dos seus órgãos é que é feito o contato com os familiares visando  a possibilidade de doação e posterior transplante.  
É uma intervenção delicada alguém solicitar a doação de órgãos para transplante  em um momento de dor pela morte de um familiar. É bastante diferente abordar  uma família que vem acompanhando a evolução de um doente crônico que se  agrava, da comunicação de uma morte decorrente de um evento abrupto, como  um acidente fatal. A doação, em ambas situações, pode dar algum sentido a esta  perda com a possibilidade de que esta decisão poderá vir a beneficiar outras pessoas. É a possibilidade de ter um gesto de amor desinteressado por pessoas desconhecidas. De uma perda individual surge a possibilidade de expressar um  amor pela humanidade.  
Desde o ponto de vista legal, no Brasil a manifestação prévia do potencial  doador, feita ainda em vida, não tem repercussões no ato de captar órgãos. A  vontade da família é soberana, o representante legal do paciente falecido – cônjuge, filho maior, pai ou mãe - é quem toma a decisão. A manifestação em  vida deste familiar é apenas um elemento de convencimento. Sem dúvida  alguma, a discussão familiar prévia atenua o processo de obtenção de órgãos.  Este é o foco que deveria orientar as escolas e outras instituições comunitárias  a discutirem a doação de órgãos fora da pressão da decisão em um momento  tão difícil, delicado e com a pressão do tempo.  
A doação, desde o ponto de vista de conduta moral, tem que ser entendida como  um comportamento recomendável, ou seja, se a pessoa aceitar doar, ela pode e  deve receber elogios por este gesto de desprendimento. Caso não aceite doar,  esta resposta é moralmente indiferente, ou seja, não é passível de elogios, nem  de desaprovação. É neste sentido que a manutenção do anonimato dos  doadores e receptores é protetora.  
Quando a doação é feita por um doador vivo, o anonimato não é possível, na  quase totalidade das vezes. Isto pode gerar um importante fator de coerção, pelo  menos afetiva entre os familiares de um paciente que está com a necessidade  de realizar um transplante. Por este motivo, é que devem ser disponibilizados  meios de apoio a estes potenciais doadores. Uma abordagem de sucesso é o  hospital ter profissionais capacitados, não vinculados a equipe assistencial que  realiza transplantes, que possam suprir, pelo menos em parte, esta  vulnerabilidade situacional que estes potenciais doadores estão submetidos. O  apoiador se disponibiliza a dar suporte a esta pessoa, auxilia em um processo  de tomada de decisão difícil e com múltiplas interações. A exemplo da doação  de paciente falecido, a doação intervivos também é uma conduta recomendável,  jamais obrigatória. 
Uma situação excepcional é a doação intervivos sem vínculos de parentesco dirigida a alguma pessoa específica. Nesta situação devem ser mantidas todas as medidas utilizadas para o doador intervivos aparentado, acrescidas de uma  avaliação realizada por uma Comitê de Bioética Clínica da instituição hospitalar  onde o procedimento será realizado. Este Comitê pode auxiliar e garantir um  adequado controle social desta situação ao realizar esta avaliação envolvendo  diferentes profissionais e representantes da comunidade não vinculados às  equipes assistenciais nem aos pacientes receptores. São diferentes instâncias  e profissionais envolvidos na proteção do paciente, mas também do doador. 
Os transplantes permitiram ampliar a possibilidade de tratamentos para  situações de extrema gravidade. A mobilização de recursos do Sistema de  Saúde para permitir a realização deste tipo de procedimento é enorme, porém  sempre começa a parir de uma decisão individual, solitária e solidária, de um  doador ou de um representante de um potencial doador. A doação de órgãos,  seja ela a partir de um doador vivo ou falecido, extrapola a esperança individual  dos pacientes, deve ser entendida na perspectiva do bem comum da sociedade.

Referências

  1. Ad Hoc Committee of the Harvard Medical School to Examine the Definition of Brain Death. A  definition of irreversible coma. JAMA. 1968;205(6):85–8.

  2. Pope Pius XII. The Prolongation of Life - An Adress to an International Congress of Anesthesiologists  (November 24, 1957). Natl Cathol Bioeth Q [Internet]. 2009;9(2):327–32.


Observação
Texto base para o capítulo publicado em: Goldim JR. 10 Ensaios de Bioética. São Leopoldo: Unisinos; 2018.

quinta-feira, 5 de junho de 2025

Bioética, Saúde, Pesquisa e Pesquisa Clínica

José Roberto Goldim


A convergência nas atividades de Pesquisa Clínica de aspectos de Saúde, de Pesquisa e de  Bioética representa uma nova compreensão e uma nova abordagem aos desafios enfrentados nesta área tão importante. 

Bioética e Complexidade 

A Bioética tem como objetivo avaliar adequação das ações que envolvem a vida e o viver. A sua reflexão é abrangente e incorpora os princípios da teoria da complexidade. Esta evolução reflete o reconhecimento de que os dilemas éticos em saúde não podem ser resolvidos através de abordagens lineares ou reducionistas. 

A Bioética Complexa utiliza o conceito de "unidade na multiplicidade", onde elementos próprios mantêm sua independência, os elementos externos geram dependência e a interação de ambos se dá por relações de interdependência. A abordagem sistêmica permite compreender como diferentes níveis de complexidade - desde partículas subatômicas até biosfera - têm influências recíprocas nas decisões em saúde, na perspectiva das questões bioéticas . 

A Bioética Complexa reconhece que os sistemas sociais e biológicos operam em diferentes graus de concordância e incerteza. As situações simples são aquelas onde há grande concordância e baixa incerteza. Por outro lado, quando existe uma baixa concordância e alta incerteza é possível identificar situações caóticas. Nas variações entre estes extremos é que é possível caracterizar as situações complexas. É fundamental para uma reflexão de qualidade reconhecer estas relações. 

Expandindo os Horizontes da Saúde 

O conceito de saúde sofreu uma evolução significativa desde a metade do século XX. Desde então, a saúde deixou de ser considerada apenas como ausência de doença e passou a ter  diferentes perspectivas, tais como: 
  • Saúde Individual, com o foco no bem-estar do indivíduo; 
  • Saúde Pública, como uma proposta de políticas e intervenções com foco nas populações; 
  • Saúde Coletiva, é uma abordagem ampliada que considera a importância dos determinantes sociais; 
  • Saúde Global, é uma perspectiva que integra as questões de saúde sem considerar fronteiras e territórios de países;
  • Saúde Planetária, é um  visão ampliada para a permitir o entendimento da interdependência da saúde humana com as questões ambientais;
  • One Health, ou Uma Só Saúde, é visão integrada das dimensões humana, animal, vegetal, e dos demais seres vivos, e ambiental. 
Não existe um claro entendimento desta progressiva complexidade. Alguns autores colocam a Saúde Planetária como o nível máximo de complexidade associado à saúde, enquanto que outros entendem que One Health, entendida como Uma Só Saúde, é a proposta mais abrangente. Independentemente desta questão, o que importa é que a saúde deve ser entendida em suas múltiplas perspectivas. 

O adequado entendimento da Saúde parte do reconhecimento de que o bem-estar não se limita à ausência de doença, mas engloba as múltiplas dimensões que incluem aspectos físicos, mentais, sociais, espirituais e ambientais, na perspectiva da interação entre diferentes níveis de complexidade. Esta abordagem abrangente da Saúde gera a demanda de uma reconfiguração nas próprias práticas de pesquisa e de intervenção em saúde. É importante avaliar o impacto das novas tecnologia na saúde das pessoas, nas populações e no ambiente. Assim poderemos ter um panorama mais abrangente das intervenções e suas repercussões.

Peculiaridades da Pesquisa Clínica

A pesquisa científica se caracteriza por gerar conhecimento com rigor científico e adequação ética. O pesquisador  convida um potencial participante de um projeto de pesquisa para que aceite ou não este convite. Esta é a lógica do processo de consentimento adequado: a participação em um projeto de pesquisa não clínica é apenas uma possibilidade. 

Nas atividades de assistência o processo de consentimento para procedimentos e tratamentos se baseia na necessidade trazida ou identificada no paciente. O profissional de saúde, após verificar esta necessidade e as alternativas de tratamento, apresenta estas opções. O operador presente neste processo é a necessidade do paciente.

Na pesquisa clínica, na maioria dos projetos, o potencial participante é também um paciente. É uma conjugação da possibilidade de participar com a necessidade de tratar. O processo de consentimento, nestas situações, tem como operador a contingência, que associa a possibilidade com a necessidade.

A pesquisa clínica passou por transformações significativas desde a formalização da medicina baseada em evidências por Guyatt em 1992. A proposta de uma "próxima geração" da medicina baseada em evidências epidemiológicas reflete a necessidade de incorporar novas metodologias e perspectivas mais amplas. Novos delineamentos, como estudos de vida real, ensaios clínicos adaptativos, apresentam novos e importantes desafios para a área metodológica, da ética aplicada à pesquisa e da própria Bioética.

Muitas pesquisas clínicas ainda são realizadas na perspectiva reducionista, ou seja, geram dados baseados em amostras muito selecionadas, gerando dificuldades de generalização. A utilização adequada de delineamentos de pesquisa e de ferramentas estatísticas permitiu um avanço significativo na geração de conhecimentos aplicados à saúde. 

O reconhecimento de que existem diferentes níveis de complexidade e abrangência do próprio conceito de saúde, faz com que a pesquisa clínica contemporânea também tenha a necessidade de transcender aos seus limites tradicionais. Desta forma, existe a necessidade de incorporar:
  • coletar, avaliar e comparar dados de múltiplas espécies de seres vivos e em diferentes ecossistemas; 
  • desenvolver abordagens metodológicas que permitam captar situações e avaliações mais abrangentes e adequadas;
  • utilizar métodos mistos de avaliação, em uma perspectiva interdisciplinar; 
  • assumir a necessidade de ter abordagens mais participativas, que incluam comunidades onde estes dados foram coletados ou onde serão utilizados; 
  • necessidade de realizar reflexões éticas complexas que incluam esta interconexão entre os múltiplos elementos dos sistemas considerados. 
Existe um entendimento inadequado de que as novas ferramentas de inteligência artificial substituirão a pesquisa clínica tradicional.  A incorporação deste novas ferramentas de busca, análise, consolidação e decisão baseadas em informações já geradas por pesquisas anteriores não substitui a investigação criativa. A inteligência artificial é um novo olhar de dados já existentes. Caso a pesquisa passe a basear-se apenas nas novas aplicações de inteligência artificial teremos somente uma reiteração de conhecimentos já existentes. A pesquisa clínica que gera novos conhecimentos deve ser mantida e aprimorada. 

Síntese e Perspectivas Futuras 

Pesquisa Clínica, ao integrar as perspectivas da Bioética Complexa, da Saúde e da Pesquisa em seus múltiplos entendimentos, não é apenas uma sobreposição de áreas, mas sim uma busca de uma síntese genuína que: 
  • Reconheça a interdependência entre a saúde, a ética e a geração de conhecimentos; 
  • Utilize o referencial da complexidade, que permita uma abordagem sistêmica e integrada; 
  • Promova a integração interdisciplinar de saberes; 
  • Valorize a multiplicidade de perspectivas considerando as  diferentes formas de geração e utilização do conhecimento. 
Esta abordagem complexa e integrada apresenta alguns desafios importantes, tais como: 
  • Metodológicos: Desenvolvimento de ferramentas de pesquisa que permitam abordar a complexidade envolvida; 
  • Éticos, com a criação e utilização de referenciais éticos adequados para problemas multidimensionais; 
  • Práticos com a implementação de intervenções que considerem, simultaneamente, os múltiplos níveis envolvidos na pesquisa 
  • Educacionais com a formação baseada em pensamento crítico, que permita ter esta compreensão nas atividades profissionais.
Conclusão 

A convergência entre Bioética Complexa, da Saúde, na perspectiva de One Health e a Pesquisa Clínica representa mais que uma tendência acadêmica - é uma necessidade para enfrentar os desafios de saúde do século XXI. Desde a ocorrência de pandemias até as consequências da emergência climática, os problemas de saúde contemporâneos demandam abordagens que reconheçam a interdependência fundamental entre sistemas humanos, animais e ambientais. 

Esta visão integrada não apenas amplia a nossa compreensão teórica, mas busca oferecer ferramentas práticas e adequadas ao desenvolvimento de projetos de pesquisa com maior efetividade e com adequação ética. Este é o desafio que se apresenta. O futuro da pesquisa em saúde, e da pesquisa clínica em particular, depende da nossa capacidade de reconhecer a complexidade presente em todos os níveis de abordagem da saúde, da pesquisa e da própria avaliação dos aspectos bioéticos envolvidos. 

Referências 





Material de Apoio - Apresentação 



Texto postado originalmente em 05/06/2025 e editado em 08/06/2025.

sábado, 31 de maio de 2025

Empatia, Simpatia e Compaixão: do sentir ao estar e o fazer

 José Roberto Goldim

As palavras Empatia, Simpatia e Compaixão têm sido utilizadas de forma pouco precisa quando se aplicam à área da saúde. Muitas confusões e ambiguidades estão presentes. Estes conceitos não foram adequadamente utilizados por múltiplos autores ao longo da história da Filosofia. Muitos problemas também surgiram em função de traduções equivocadas de um idioma a outro, sem levar em conta o contexto cultural e o uso de sinônimos.

Empatia

Na Grécia antiga, existia a palavra Empatheia (ἐμπάθεια), com um sentido relacionado à intensidade emocional ou à paixão. Aristóteles utilizou o termo em-pathein, na Retórica, como a explicação para a “animação do inanimado”. Ele associava este conceito à forma pela qual os oradores despertavam emoções no público, era uma forma de persuadir com eficácia [1].

Quando Herder criou a palavra Einfülung, em 1774, o significado a ela atribuído foi de união ou fusão emocional com outros seres ou objetos. Esta palavra se referia a situação de quando nos colocamos no estado emotivo da pessoa a quem estas manifestações pertencem [2]. Para explicar coloquialmente o significado de Empatia, muitas vezes é utilizada a expressão: "se colocar nos sapatos do outro".

Robert Vischer, em conjunto com seu pai Friedrich Theodor Vicher, em 1873, propôs que Einfühlung seria a “continuação imediata de uma observação externa em um sentimento interno”. De certa forma, é uma interpretação que retoma a definição de Aristóteles, pois assume um prazer estético a partir de uma obra inanimada, mas plena de conteúdo. Foi uma proposta para explicar questões estéticas associadas à experiência artística [2].

Theodor Lipps, em 1897, propôs que a Empatia é um sentimento unidirecional em relação ao mundo privado do outro. Ele estabeleceu uma série de questões relacionadas ao entendimento da palavra Einfühlung na área da Estética [2].

Edmond Husserl, em 1913, também refletiu sobre a Empatia alterando o enfoque. Ele entendeu que a Empatia é a constituição do outro, desde uma perspectiva fenomenológica. Foi esta proposta que permitiu caracterizar a relação entre Empatia e intersubjetividade [3]. O pensamento de Husserl foi a base para que outros dois autores, Edith Stein e Alfred Schütz, refletissem mais profundamente sobre a Empatia.

Edith Stein publicou, em 1917, a sua tese de doutorado, orientada por Husserl, cujo título era “Sobre o Problema da Empatia”. Nesta tese ela estabelece que a Empatia é um ato pessoal, é um elemento fundante para a convivência. O “outro” é uma pessoa com vivências próprias, que podem ser acessadas por meio da Empatia [4].

Posteriormente, Max Scheller, ampliou este conceito, em 1923, ao entender a Empatia como a percepção do outro. Na sua perspectiva, da experiência de reconhecer o sofrimento alheio, surge a percepção do outro que sofre. É a possibilidade do sentimento presente na vida emocional. Em uma situação extrema de uma vivência pessoal mais intensa. Assim, "o sofrimento não será mais do outro, mas meu, e eu acredito poder subtrair-me a ele evitando o quadro ou o aspecto do sofrimento em geral" [5].

Alfred Schütz, também influenciado por Husserl, em seu único livro publicado em vida, em 1932, assumiu uma posição mais dialógica, propôs que a Empatia é um processo interpretativo, mais do que uma simples percepção, era, na realidade, a compreensão do outro. Ele introduziu a questão da intersubjetividade na compreensão da Empatia [6].

Schütz retoma o pensamento de Edmond Husserl, afirmando que, embora não possamos vivenciar diretamente a consciência do outro, temos vivências do “outro”, mediadas por meio da Empatia. É esta experiência que atribui sentido às ações alheias, que permite manter a distinção entre o “eu” e o “outro”. É a Empatia que permite estabelecer uma comunicação intersubjetiva, que é a base do mundo social em que se vive (Lebenswelt) [7].

Em 2024, um estudo experimental demonstrou que a Empatia pode ser desenvolvida e aprimorada mediante modelagem social. Exemplos de outras pessoas em situações que demonstram empatia influenciam outras pessoas a terem comportamentos semelhantes [8].

Simpatia

Aristóteles utilizou a palavra oikeion (οἰκεῖον) para descrever a natural atração para o que é afim, antecipando o uso da palavra Simpatia [9]. Uma das primeiras utilizações da palavra Sympátheia (συμπάθεια) foi feita por Crísipo de Soles, ao caracterizar a interconexão de todos os elementos do universo.

Em 1736, David Hume utilizou a palavra Simpatia para afirmar que ninguém é completamente indiferente à felicidade ou ao sofrimento dos outros [10].

Em 1767, Pierre-Augustin Caron de Beaumarchais utilizou a mesma palavra Simpatia para definir a “reação emocional espontânea através da qual fazemos deste acontecimento nosso, um sentimento que nos coloca no lugar do sofredor, no meio da sua situação”. Na sua concepção, o teatro tem um efeito transformador, na medida em que provoca reações de identificação no espectador [11].

Simpatia é sentir com o outro, é ter uma afinidade para com o outro. Simpatia é uma ressonância emocional com o Outro. A pessoa pode ter uma simpatia positiva que a identifica com o outro ou negativa que a afasta do outro. A simpatia pode desempenhar um papel de facilitar ou dificultar a relação entre profissionais de saúde e pacientes. A simpatia pode ser o ponto de partida afetivo para chegar na perspectiva ética da Solicitude, proposta por Paul Ricoeur [11a]. Compaixão

Outra palavra que tem sido utilizada com múltiplos sentidos é Compaixão, que pode ser entendida apenas como uma resposta emocional, natural e instintiva, diante do sofrimento do outro. A compaixão pode ser entendida como uma resposta emocional diante do sofrimento do outro, mas que não necessariamente leva a ação. A compaixão pode existir em quem sofre junto, mesmo sem querer ou poder intervir no sofrimento alheio.

Os gregos tinham a palavra Oiktirmos (οἰκτιρμός) que significa ser uma pessoa compassiva, ou compadecer-se. Esta mesma palavra foi utilizada por Lucas, em seu Evangelho (Lc 1:78), se referindo à Misericórdia de Deus, como uma Misericórdia profunda, utilizando a expressão “entranhas de Misericórdia”. Em outras partes do seu evangelho, Lucas volta a utilizar esta mesma palavra para expressar a Compaixão humana. Segundo ele, os personagens descritos nas parábolas do Bom Samaritano (Lc 10:25-37) e do Filho Pródigo (Lc 15:11-32) foram movidos pela Compaixão [12].

Outros autores também refletiram sobre esta questão. São João Crisóstomo, no século III, caracterizou a Compaixão como uma virtude fundamental [13].

Compaixão também pode ser uma atitude diante do outro que sofre. Anselm Grün, caracterizou a Compaixão não como uma virtude, mas sim como uma atitude diante de uma situação de sofrimento [14]. As atitudes são um gesto, uma disposição interna, uma maneira de agir.

A Compaixão, entendida como uma virtude, como um agir, se apresenta como uma disposição firme e constante para aliviar o sofrimento. A Compaixão, sendo uma virtude, é ordenada pela razão, mas é sustentada pelo amor. A compaixão é estável, é racionalmente guiada, é orientada a fazer o bem e é reconhecida como socialmente adequada. A Compaixão percebe o outro que sofre como alguém que mantém a sua autonomia, mas que merece esta relação de ajuda, derivada do sofrer reconhecido.

Em 1985, Edmund Pellegrino, caracterizou a Compaixão como uma característica fundamental do Médico Virtuoso. Uma pessoa virtuosa é alguém em quem podemos confiar por agir, habitualmente, de uma maneira boa. Nesta perspectiva, a Compaixão é uma relação genuína de ajuda ao outro que sofre [15].

Compaixão, Clemência, Piedade e Misericórdia são, muitas vezes, utilizadas como sinônimos. Por exemplo, Tomás de Aquino, ao redor do ano de 1269, no final da reflexão da questão 30 da Suma Teológica, denominou a virtude da Compaixão como sendo Misericórdia [16]. Porém, é importante caracterizar algumas diferenças entre os seus significados, que podem estar associados, além dos aspectos éticos e sociais, a contextos religiosos. Clemência foi utilizada por Sêneca, na Carta a Lucíolo, para criticar a misericórdia. Sêneca afirmava que "o sábio ajuda o outro, não porque sofre com ele, mas porque é justo fazê-lo" (17).

Piedade pode ter dois significados distintos: ser piedoso e ter Piedade. Em ambos os casos, são relações verticais entre pessoas. Ter Piedade "do outro" pode ser entendida como uma relação vertical que não valoriza a autonomia da pessoa que sofre, podendo inclusive destituir o seu próprio sofrimento. As pessoas, em geral, não gostam de ser objeto da Piedade dos outros, pois isto as diminui e pode, até mesmo, invalidar o seu próprio sofrimento, ao ter a sua autonomia desconsiderada. Nesta perspectiva, a Piedade é percebida apenas como uma relação que diminui o outro que sofre, que se apropria do seu sofrimento [18]. Ser piedoso "com o outro" pode ser uma resposta a um pedido de ajuda. Ser piedoso também é uma relação vertical com a pessoa que sofre, que está fragilizada, reconhecendo a sua vulnerabilidade decorrente do sofrimento. Até mesmo quando existe a impossibilidade de agir diretamente sobre o sofrimento em si. Ser piedoso se manifesta por meio de um gesto, por uma atitude de acolhimento. A expressão artística mais conhecida da Piedade, neste sentido, são aquelas denominadas como Pietàs.

A Piedade também pode ser uma expressão de reverência ou devoção religiosa. Neste sentido, a Piedade é a devoção ou o respeito a Deus, ou aos pais e ancestrais. Desta relação vertical surge a possibilidade do acolhimento horizontal às demais pessoas com as quais nos relacionamos. Desta forma, a Piedade se refere à virtude da Justiça. É uma virtude que se abre ao outro, que busca a não discriminação, a igualdade e a equidade [9].

A Misericórdia também é uma relação vertical, habitualmente relacionada a uma manifestação divina. A Misericórdia acolhe, sem destituir o outro que sofre. A própria palavra latina Misericordia, composta por duas outras palavras: miseratio, entendida como sofrimento, e cordis, como sendo “do coração”, ou seja, se refere a um sentimento que expressa uma perspectiva de acolhimento [13].

Após ter realizado esta diferenciação, é importante entender a Compaixão como sendo uma virtude inerente ao profissional de saúde. É importante reconhecer a necessidade do profissional ser uma presença compassiva junto ao paciente, que não invade ou domina a dor do outro. A compaixão é uma presença não invasiva diante do sofrimento do outro. A verdadeira compaixão valida o sofrimento do outro e exige reverência e uma presença silenciosa, não tem soluções fáceis, mas é sempre a expressão de uma genuína relação de ajuda.

É a Compaixão que mobiliza para estabelecer uma relação de ajuda com o outro, enquanto que a Solicitude é que dá sustentabilidade a esta relação [11a].

Considerações Finais

Empatia, Simpatia e Compaixão são palavras que se confundem no uso diário das pessoas. É importante compreender cada um dos significados associados a cada uma delas visando permitir o seu uso adequado.

Empatia é um sentimento que nos dá acesso às vivências alheias, que nos coloca no lugar das outras pessoas. Empatia é o nome da “nossa experiência das vivências do outro”, é o que permite compreender e sentir como o “outro” (Einfühlung). A Empatia, é importante ressaltar, mantém a diferenciação do “si mesmo” e do “outro”.

A Simpatia, por outro lado, é um sentimento de afinidade emocional, frequentemente associada a uma identificação pessoal. A Simpatia envolve um afeto compartilhado, seja no sentido de se congratular com a alegria do outro ou se associar ao seu sofrimento. É a Simpatia que estabelece o compromisso afetivo de "estar com o outro” (Mitfühlung).

A Compaixão, finalmente, é uma virtude, é uma ação, e não um sentimento, como a Empatia ou a Simpatia. Na Compaixão, além do reconhecimento do sofrimento alheio, existe um dever de estabelecer uma relação de ajuda “de mim” para com “outro” que sofre [19]. É a Compaixão que permite efetivar o direito à solidariedade [9].

Empatia, Simpatia e Compaixão são características fundantes e fundamentais da adequada relação dos profissionais de saúde ao permitir sentir, estar e ajudar pacientes, familiares, colegas e a sociedade como um todo.

Hipócrates, no primeiro livro da Epidemia, estabeleceu as regras para uma boa relação médico-paciente: "Tenha, em relação às doenças, duas coisas em vista: ajuda ou, ao menos, não prejudica" (20). Esta é a expressão concreta da Empatia, da Simpatia e da Compaixão.

Referências

1)  Aristóteles. Retórica. Lisboa: Imprensa Nacional-Casa da Moeda; 2005. 

2)  Hunsdahl JB. Concerning Einfühlung (empathy): A concept analysis of its origin and early development. J Hist Behav Sci. 1967 Apr;3(2):180–91.

3)  Husserl E. Ideias para uma Fenomenologia Pura e uma Filosofia Fenomenológica – Ideen I. São Paulo: Ideias e Letras; 2012. 

4) Stein E. Sobre el problema de la empatía. Madrid: Trotta; 2004. 

5) Scheler M. Wesen und Formen der Symphatie. Bremen: Salzwasser-Verlag; 2015. 

6)  Schütz, Alfred, Der sinnhafte Aufbau der sozialen Welt, Suhrkamp, Frankfurt am Main, 1981(1932):29.

7)  Gros AE. El debate de Alfred Schütz con Max Scheler en torno a la empatía. Tópicos [online]. 2012;(2):

8)  Zhou Y, Han S, Kang P, Tobler PN, Hein G. The social transmission of empathy relies on observational reinforcement learning. Proc Natl Acad Sci [Internet]. 2024 Feb 27;121(9):2017. 

9)  Aristóteles. Ética a Nicômacos. 2nd ed. Brasília: Universidade de Brasília; 1992. 

10)  Hume D. Tratado da natureza humana: uma tentativa de introduzir o método experimental de raciocínio nos assuntos morais. São Paulo: Unesp; 2001.

11) Beaumarchais P-AC de. Essai sur le genre dramatique sérieux. In: Euvres complètes. Paris: Laplace, Sanches et Cie; 1876:1–8.

11a) Ricoeur P. O Si-mesmo como um outro. Campinas: Papirus, 1991.

12)  Bíblia Sagrada com reflexões de Lutero: nova tradução na linguagem de hoje. Barueri: Sociedade Bíblica do Brasil; 2016.

13)  Schaff P. Nicene and Post-Nicene Fathers. Peabody: Hendrikson; 1995. 

14)  Grün A. Atitudes que transformam. Petrópolis: Vozes; 2017. 

15)  Pellegrino ED. Virtuous Physician, and the Ethics of Medicine. In: Shelp EE, editor. Virtue and Medicine. D. Reidel Publishing Company; 1985:237–55.

16)  Aquino T de. Suma Teológica Vol.I-XI. 2ed. Porto Alegre: EST/Sulina/UCS; 1980. 

17) Séneca LA. Cartas morales a Lucilio - tomo segundo. Barcelona: Iberia; 1955. 

18) Callan E. The moral status of pity. Can J Philos. 1988;18:1–12. 

19) Zahavi, Dan, Phänomenologie für Einsteiger, W. Fink, Paderborn, 2007:71.

20) Hippocrate. Oevres completes d’Hippocrate. Vol. II Épidémies premier livre. Paris: Bailliéré, 1840:635.


Texto publicado em 31/05/2025 e editado em 05/08/2025