José Roberto Goldim
As palavras Empatia, Simpatia e Compaixão têm sido utilizadas de forma pouco precisa quando se aplicam à área da saúde. Muitas confusões e ambiguidades estão presentes. Estes conceitos não foram adequadamente utilizados por múltiplos autores ao longo da história da Filosofia. Muitos problemas também surgiram em função de traduções equivocadas de um idioma a outro, sem levar em conta o contexto cultural e o uso de sinônimos.
Empatia
Na Grécia antiga, existia a palavra Empatheia (ἐμπάθεια), com um sentido relacionado à intensidade emocional ou à paixão. Aristóteles utilizou o termo em-pathein, na Retórica, como a explicação para a “animação do inanimado”. Ele associava este conceito à forma pela qual os oradores despertavam emoções no público, era uma forma de persuadir com eficácia [1].
Quando Herder criou a palavra Einfülung, em 1774, o significado a ela atribuído foi de união ou fusão emocional com outros seres ou objetos. Esta palavra se referia a situação de quando nos colocamos no estado emotivo da pessoa a quem estas manifestações pertencem [2]. Para explicar coloquialmente o significado de Empatia, muitas vezes é utilizada a expressão: "se colocar nos sapatos do outro".
Robert Vischer, em conjunto com seu pai Friedrich Theodor Vicher, em 1873, propôs que Einfühlung seria a “continuação imediata de uma observação externa em um sentimento interno”. De certa forma, é uma interpretação que retoma a definição de Aristóteles, pois assume um prazer estético a partir de uma obra inanimada, mas plena de conteúdo. Foi uma proposta para explicar questões estéticas associadas à experiência artística [2].
Theodor Lipps, em 1897, propôs que a Empatia é um sentimento unidirecional em relação ao mundo privado do outro. Ele estabeleceu uma série de questões relacionadas ao entendimento da palavra Einfühlung na área da Estética [2].
Edmond Husserl, em 1913, também refletiu sobre a Empatia alterando o enfoque. Ele entendeu que a Empatia é a constituição do outro, desde uma perspectiva fenomenológica. Foi esta proposta que permitiu caracterizar a relação entre Empatia e intersubjetividade [3]. O pensamento de Husserl foi a base para que outros dois autores, Edith Stein e Alfred Schütz, refletissem mais profundamente sobre a Empatia.
Edith Stein publicou, em 1917, a sua tese de doutorado, orientada por Husserl, cujo título era “Sobre o Problema da Empatia”. Nesta tese ela estabelece que a Empatia é um ato pessoal, é um elemento fundante para a convivência. O “outro” é uma pessoa com vivências próprias, que podem ser acessadas por meio da Empatia [4].
Posteriormente, Max Scheller, ampliou este conceito, em 1923, ao entender a Empatia como a percepção do outro. Na sua perspectiva, da experiência de reconhecer o sofrimento alheio, surge a percepção do outro que sofre. É a possibilidade do sentimento presente na vida emocional. Em uma situação extrema de uma vivência pessoal mais intensa. Assim, "o sofrimento não será mais do outro, mas meu, e eu acredito poder subtrair-me a ele evitando o quadro ou o aspecto do sofrimento em geral" [5].
Alfred Schütz, também influenciado por Husserl, em seu único livro publicado em vida, em 1932, assumiu uma posição mais dialógica, propôs que a Empatia é um processo interpretativo, mais do que uma simples percepção, era, na realidade, a compreensão do outro. Ele introduziu a questão da intersubjetividade na compreensão da Empatia [6].
Schütz retoma o pensamento de Edmond Husserl, afirmando que, embora não possamos vivenciar diretamente a consciência do outro, temos vivências do “outro”, mediadas por meio da Empatia. É esta experiência que atribui sentido às ações alheias, que permite manter a distinção entre o “eu” e o “outro”. É a Empatia que permite estabelecer uma comunicação intersubjetiva, que é a base do mundo social em que se vive (Lebenswelt) [7].
Em 2024, um estudo experimental demonstrou que a Empatia pode ser desenvolvida e aprimorada mediante modelagem social. Exemplos de outras pessoas em situações que demonstram empatia influenciam outras pessoas a terem comportamentos semelhantes [8].
Simpatia
Aristóteles utilizou a palavra oikeion (οἰκεῖον) para descrever a natural atração para o que é afim, antecipando o uso da palavra Simpatia [9]. Uma das primeiras utilizações da palavra Sympátheia (συμπάθεια) foi feita por Crísipo de Soles, ao caracterizar a interconexão de todos os elementos do universo.
Em 1736, David Hume utilizou a palavra Simpatia para afirmar que ninguém é completamente indiferente à felicidade ou ao sofrimento dos outros[10].
Em 1767, Pierre-Augustin Caron de Beaumarchais utilizou a mesma palavra Simpatia para definir a “reação emocional espontânea através da qual fazemos deste acontecimento nosso, um sentimento que nos coloca no lugar do sofredor, no meio da sua situação”. Na sua concepção, o teatro tem um efeito transformador, na medida em que provoca reações de identificação no espectador [11].
Simpatia é sentir com o outro, é ter uma afinidade para com o outro. A pessoa pode ter uma simpatia positiva que a identifica com o outro ou negativa que a afasta do outro. A rigor, a simpatia tem pouco envolvimento prático. Compaixão
Outra palavra que tem sido utilizada com múltiplos sentidos é Compaixão, que pode ser entendida apenas como uma resposta emocional, natural e instintiva, diante do sofrimento do outro. A compaixão pode ser entendida como uma resposta emocional diante do sofrimento do outro, mas que não necessariamente leva a ação. A compaixão pode existir em quem sofre junto, mesmo sem querer ou poder intervir no sofrimento alheio.
Os gregos tinham a palavra Oiktirmos (οἰκτιρμός) que significa ser uma pessoa compassiva, ou compadecer-se. Esta mesma palavra foi utilizada por Lucas, em seu Evangelho (Lc 1:78), se referindo à Misericórdia de Deus, como uma Misericórdia profunda, utilizando a expressão “entranhas de Misericórdia”. Em outras partes do seu evangelho, Lucas volta a utilizar esta mesma palavra para expressar a Compaixão humana. Segundo ele, os personagens descritos nas parábolas do Bom Samaritano (Lc 10:25-37) e do Filho Pródigo (Lc 15:11-32) foram movidos pela Compaixão [12].
Outros autores também refletiram sobre esta questão. São João Crisóstomo, no século III, caracterizou a Compaixão como uma virtude fundamental [13].
Compaixão também pode ser uma atitude diante do outro que sofre. Anselm Grün, caracterizou a Compaixão não como uma virtude, mas sim como uma atitude diante de uma situação de sofrimento [14]. As atitudes são um gesto, uma disposição interna, uma maneira de agir.
A Compaixão, entendida como uma virtude, como um agir, se apresenta como uma disposição firme e constante para aliviar o sofrimento. A Compaixão, sendo uma virtude, é ordenada pela razão, mas é sustentada pelo amor. A compaixão é estável, é racionalmente guiada, é orientada a fazer o bem e é reconhecida como socialmente adequada. A Compaixão percebe o outro que sofre como alguém que mantém a sua autonomia, mas que merece esta relação de ajuda, derivada do sofrer reconhecido.
Em 1985, Edmund Pellegrino, caracterizou a Compaixão como uma característica fundamental do Médico Virtuoso. Uma pessoa virtuosa é alguém em quem podemos confiar por agir, habitualmente, de uma maneira boa. Nesta perspectiva, a Compaixão é uma relação genuína de ajuda ao outro que sofre [15].
Compaixão, Clemência, Piedade e Misericórdia são, muitas vezes, utilizadas como sinônimos. Por exemplo, Tomás de Aquino, ao redor do ano de 1269, no final da reflexão da questão 30 da Suma Teológica, denominou a virtude da Compaixão como sendo Misericórdia [16]. Porém, é importante caracterizar algumas diferenças entre os seus significados, que podem estar associados, além dos aspectos éticos e sociais, a contextos religiosos. Clemência foi utilizada por Sêneca, na Carta a Lucíolo, para criticar a misericórdia. Sêneca afirmava que "o sábio ajuda o outro, não porque sofre com ele, mas porque é justo fazê-lo" (17).
Piedade pode ter dois significados distintos: ser piedoso e ter Piedade. Em ambos os casos, são relações verticais entre pessoas. Ter Piedade "do outro" pode ser entendida como uma relação vertical que não valoriza a autonomia da pessoa que sofre, podendo inclusive destituir o seu próprio sofrimento. As pessoas, em geral, não gostam de ser objeto da Piedade dos outros, pois isto as diminui e pode, até mesmo, invalidar o seu próprio sofrimento, ao ter a sua autonomia desconsiderada. Nesta perspectiva, a Piedade é percebida apenas como uma relação que diminui o outro que sofre, que se apropria do seu sofrimento [18]. Ser piedoso "com o outro" pode ser uma resposta a um pedido de ajuda. Ser piedoso também é uma relação vertical com a pessoa que sofre, que está fragilizada, reconhecendo a sua vulnerabilidade decorrente do sofrimento. Até mesmo quando existe a impossibilidade de agir diretamente sobre o sofrimento em si. Ser piedoso se manifesta por meio de um gesto, por uma atitude de acolhimento. A expressão artística mais conhecida da Piedade, neste sentido, são aquelas denominadas como Pietàs.
A Piedade também pode ser uma expressão de reverência ou devoção religiosa. Neste sentido, a Piedade é a devoção ou o respeito a Deus, ou aos pais e ancestrais. Desta relação vertical surge a possibilidade do acolhimento horizontal às demais pessoas com as quais nos relacionamos. Desta forma, a Piedade se refere à virtude da Justiça. É uma virtude que se abre ao outro, que busca a não discriminação, a igualdade e a equidade [9].
A Misericórdia também é uma relação vertical, habitualmente relacionada a uma manifestação divina. A Misericórdia acolhe, sem destituir o outro que sofre. A própria palavra latina Misericordia, composta por duas outras palavras: miseratio, entendida como sofrimento, e cordis, como sendo “do coração”, ou seja, se refere a um sentimento que expressa uma perspectiva de acolhimento [13].
Após ter realizado esta diferenciação, é importante entender a Compaixão como sendo uma virtude inerente ao profissional de saúde. É importante reconhecer a necessidade do profissional ser uma presença compassiva junto ao paciente, que não invade ou domina a dor do outro. A compaixão é uma presença não invasiva diante do sofrimento do outro. A verdadeira compaixão valida o sofrimento do outro e exige reverência e uma presença silenciosa, não tem soluções fáceis, mas é sempre a expressão de uma genuína relação de ajuda.
Considerações Finais
Empatia, Simpatia e Compaixão são palavras que se confundem no uso diário das pessoas. É importante compreender cada um dos significados associados a cada uma delas visando permitir o seu uso adequado.
Empatia é um sentimento que nos dá acesso às vivências alheias, que nos coloca no lugar das outras pessoas. Empatia é o nome da “nossa experiência das vivências do outro”, é o que permite compreender e sentir como o “outro” (Einfühlung). A Empatia, é importante ressaltar, mantém a diferenciação do “si mesmo” e do “outro”.
A Simpatia, por outro lado, é um sentimento de afinidade emocional, frequentemente associada a uma identificação pessoal. A Simpatia envolve um afeto compartilhado, seja no sentido de se congratular com a alegria do outro ou se associar ao seu sofrimento. É a Simpatia que estabelece o compromisso afetivo de "estar com o outro” (Mitfühlung).
A Compaixão, finalmente, é uma virtude, é uma ação, e não um sentimento, como a Empatia ou a Simpatia. Na Compaixão, além do reconhecimento do sofrimento alheio, existe um dever de estabelecer uma relação de ajuda “de mim” para com “outro” que sofre [19]. É a Compaixão que permite efetivar o direito à solidariedade [9].
Empatia, Simpatia e Compaixão são características fundantes e fundamentais da adequada relação dos profissionais de saúde ao permitir sentir, estar e ajudar pacientes, familiares, colegas e a sociedade como um todo.
Hipócrates já havia proposto no primeiro livro da Epidemia, estabeleceu as primeiras regras para uma boa relação médico-paciente: "Tenha, em relação às doenças, duas coisas em vista: ajuda ou, ao menos, não prejudica" (20).
Referências
1) Aristóteles. Retórica. Lisboa: Imprensa Nacional-Casa da Moeda; 2005.
3) Husserl E. Ideias para uma Fenomenologia Pura e uma Filosofia Fenomenológica – Ideen I. São Paulo: Ideias e Letras; 2012.
4) Stein E. Sobre el problema de la empatía. Madrid: Trotta; 2004.
5) Scheler M. Wesen und Formen der Symphatie. Bremen: Salzwasser-Verlag; 2015.
6) Schütz, Alfred, Der sinnhafte Aufbau der sozialen Welt, Suhrkamp, Frankfurt am Main, 1981(1932):29.
9) Aristóteles. Ética a Nicômacos. 2nd ed. Brasília: Universidade de Brasília; 1992.
10) Hume D. Tratado da natureza humana: uma tentativa de introduzir o método experimental de raciocínio nos assuntos morais. São Paulo: Unesp; 2001.
12) Bíblia Sagrada com reflexões de Lutero: nova tradução na linguagem de hoje. Barueri: Sociedade Bíblica do Brasil; 2016.
13) Schaff P. Nicene and Post-Nicene Fathers. Peabody: Hendrikson; 1995.
14) Grün A. Atitudes que transformam. Petrópolis: Vozes; 2017.
15) Pellegrino ED. Virtuous Physician, and the Ethics of Medicine. In: Shelp EE, editor. Virtue and Medicine. D. Reidel Publishing Company; 1985:237–55.
16) Aquino T de. Suma Teológica Vol.I-XI. 2ed. Porto Alegre: EST/Sulina/UCS; 1980.
17) Séneca LA. Cartas morales a Lucilio - tomo segundo. Barcelona: Iberia; 1955.
18) Callan E. The moral status of pity. Can J Philos. 1988;18:1–12.
19) Zahavi, Dan, Phänomenologie für Einsteiger, W. Fink, Paderborn, 2007:71.
20) Hippocrate. Oevres completes d’Hippocrate. Vol. II Épidémies premier livre. Paris: Bailliéré, 1840:635.
Texto publicado em 31/05/2025 e editado em 15/06/2025